quinta-feira, 17 de maio de 2007

O pecado original da mídia...

Já está no romance a abertura genial da estória, que no rádio conservou a força e amplificou o efeito de empatia pretendido pelo autor do livro: descreve como as pessoas na terra seguiam vivendo a sua vida normal, ocupadas com seus vários afazeres, esperanças e ilusões cotidianas, "sem se darem conta de que a vida no planeta vinha sendo observada por inteligências superiores às nossas, porém tão mortais quanto somos, que nos examinavam assim como examinamos os microorganismos que povoam uma gota d'água". Nesta introdução, o roteirista apenas atualizou o presente da narrativa, transferindo "o olhar invejoso e sem simpatia dos marcianos", originalmente postado na vida inglesa do fim do século, para o contexto americano em 1938.


No final da década de
30
, o que mais os americanos mais gostavam de fazer era ouvir rádio, e é aí que o veículo entra em cena como protagonista central da estória. Já no segundo minuto da peça, somos levados a esquecer que estamos ouvindo uma obra de ficção, pois aparentemente esta foi interrompida por um boletim metereológico absolutamente verossímil. Em seguida, estamos acompanhando um programa de música ao vivo, entrecortado por boletins de notícias, que a princípio são bastante realistas e tornam-se cada vez mais freqüentes.


O uso de boletins de notícias foi uma idéia de Welles, segundo o depoimento de Koch. Mas se a introdução do rádio na estória é uma criação da equipe nova-iorquina, a notícia já representara um elemento narrativo importante no romance de H.G. Wells. Porém, de forma diferente: na invasão de Londres pelos marcianos, os personagens da estória original eram ávidos consumidores de jornais, em cujas edições extras procuravam informações para entender o caos que tomara conta "da mãe de todas as cidades" do auge do Império Britânico.

Mas em A Guerra dos Mundos de Welles, a mãe de todas as cidades agora era Nova York, umbigo do novo império, e Nova York vivia ligada no rádio. A diferença fundamental, em relação ao romance, é que nesta nova versão os personagens da estória não são apenas ouvintes de rádio - o que representaria a mera atualização dos personagens-leitor de jornal, passivos: agora, os personagens falam pelo rádio. E, mais do que falar entre si, falam diretamente aos ouvintes.

Continua

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