quinta-feira, 17 de maio de 2007

O pecado original da mídia...

A simplicidade é um imperativo do meio e de sua linguagem. Esta lei é sustentada por todos os teóricos do rádio, desde os seus primórdios, quando já começaram a notar a incompatibilidade entre as formas demasiadamente complexas e o veículo exclusivamente auditivo. Está expressa nos alemães KOLB (1931) e ARNHEIM (1936), nos franceses FUZELIER (1965) e TARDIEU (1969) , no belga Theo FLEISHMAN, que fez as primeiras normas de redação para o rádio jornalismo na Europa, e no escritor italiano Carlo Emilio GADDA, que as estabeleceu para a RAI na década de 40.

Portanto, tecnicamente, a simplificação da estória, com a substituição do filósofo pelo astrônomo, pode ter sido uma boa solução. Porém, do ponto de vista estético, houve uma inegável banalização do tema, o que certamente foi uma das razões da revolta de H.G. Wells com o uso que os americanos fizeram de sua obra. (SARRAUTE,
1976).


O escritor inglês, um humanista convicto, havia pensado A Guerra dos Mundos sobretudo como um questionamento a respeito da civilização, e especialmente do imperialismo de seu país, que na época dominava o mundo. A brutalidade dos marcianos, que se alimentavam de sangue humano, matavam sem necessidade aparente e transformavam tudo a seu alcance em cinzas, é a todo momento comparada, pelo personagem-filósofo do romance, com os genocídios praticados pelos europeus contra os povos por eles colonizados, à crueldade corrente com os animais e à arrogante destruição da natureza por parte de seus compatriotas.

Muito pouco sobrou, desta "moral da estória", na versão do rádio. Talvez a equipe de Orson Welles não fosse tão sensível a estes temas, provavelmente a empresa que pagava os seus salários também não o era, e certamente eram preocupações alheias à cultura de um império emergente, na qual o Mercury Theatre da CBS estava inserido.


À moda americana, no programa de rádio todo o mal é encarnado em uma pessoa, um psicopata com que topa o professor Pearson em sua caminhada, e que pretende aprender com os marcianos para depois dominar seus semelhantes e conquistar o mundo. A semelhança com Hitler e Stálin, na época já temidos e demonizados como virtuais inimigos do mundo livre, é mais do que evidente. No livro, este personagem também existe, mas não pensa em dominar ninguém, sua loucura é só de pensar em ser capaz de derrotar os extraterrestres.

Continua

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