quarta-feira, 17 de janeiro de 2007

Em busca de mundos de diamantes



Camada subterrânea de diamantes de um planeta carbonado exposta devido a um impacto recente.Uma atmosfera fina e cheia de fumaça esconde boa parte da superfície do planeta, que parece coberta de alcatrão Lynette Cook




Em busca de mundos de diamantes.

Alguns planetas extra-solares podem conter diamante puro - e poderão sair ilesos de qualquer coisa que o Universo lance neles
Por Ray Villard.

No filme de ficção científica de 2003 The core, um veículo de navegação subterrânea transportando "terranautas" se desvia de diamantes, de até 3.000 km2, que flutuam no manto terrestre. Num cenário não tão inverossímil quanto o desse filme, nossa galáxia pode conter uma série de planetas cobertos por um espesso manto de carbono cristalizado - formando o que conhecemos como diamante.

A superfície desses planetas carbonados hipotéticos provavelmente se apresenta como uma paisagem de alcatrão, negra como carvão, com elevações duras como cerâmica e que resistem a temperaturas altíssimas. Protegidos por essa dura couraça, mundos de diamante poderiam muito bem existir nas vizinhanças menos evoluídas da nossa galáxia.

Esses podem ser os únicos planetas capazes de conter informação sobre as estrelas de nêutrons. Se existirem, devem orbitar muito próximos de estrelas normais, onde temperaturas extremamente altas derretem as rochas comuns.

É provável que planetas carbonados se formem em torno de estrelas de formação recente através do choque com elementos mais pesados encontrados no núcleo da Galáxia.

Num Universo que continua a evoluir quimicamente e que cada vez está mais cheio de poeira, os planetas-diamante um dia poderão ser os planetas recém-nascidos mais abundantes em qualquer lugar. Embora nenhum planeta-diamante tenha sido descoberto até agora, os teóricos estão bastante interessados em explorar essa possibilidade.

Numa conferência sobre planetas extra-solares realizada em Aspen, Colorado, em fevereiro do ano passado, o astrônomo da Princeton University, Marc Kuchner propôs a idéia de mundos de diamantes. Kuchner acredita que mundos desse tipo poderão aparecer nos próximos dez anos, à medida que mais e mais planetas forem descobertos em torno de estrelas vizinhas.

Os astrônomos esperam encontrar planetas terrestres em torno de estrelas próximas pelo final dessa segunda década de descobertas de exoplanetas. À medida que forem determinadas as características desses planetas, os astrônomos provavelmente vão se dar conta de que seu interior é muito mais complexo e variado que imaginam.

Além disso, atualmente, os teóricos têm como base quase que exclusivamente a estrutura do Sistema Solar. Nosso sistema solar contém basicamente três tipos de planetas: os gigantes inflados com gás em baixa densidade Júpiter e Saturno; os gigantes gelados Urano e Netuno; e os quatro planetas terrestres Mercúrio, Vênus, Terra e Marte.

Estes últimos corpos sólidos rochosos são estratificados, como as camadas de bolo e musse nas tortas de chocolate. Todos dispõem de um núcleo de ferro envolto por uma casca de material rochoso mais leve.

As teorias convencionais sugerem que os planetas terrestres se formaram por aglutinação de matéria contida num disco de poeira e gás que girava em torno do Sol 4,5 bilhões de anos atrás. O disco de poeira continha grãos de fumaça misturados aos gases.

Estes elementos foram forjados em fornalhas de fusão nuclear que havia no interior de uma geração mais antiga de estrelas. O carbono está entre os subprodutos mais comuns das reações de fusão que ocorreram no interior de estrelas semelhantes ao Sol, na etapa final de sua vida. Nas etapas seguintes da evolução dessas estrelas boa parte de sua atmosfera escapou para o espaço, como um balão de gás aquecido desgarrado.

À medida que a atmosfera externa se expande e vai se resfriando, o carbono forjado no interior da estrela pela fusão (que consome hélio) se esfria e forma grãos de poeira, ejetados de volta para o espaço. Esses grãos formam cerca de 1% das nuvens de gás interestelar.

No entanto, o ponto crucial está nos detalhes da mistura química exata que produz a matéria-prima para os planetas. O manto terrestre é formado principalmente por silicatos. Estes compostos de silício e oxigênio se combinaram enquanto o disco circunestelar que girava em torno do proto-sol esfriava.

Kuchner argumenta que se o disco proto-estelar de uma estrela tiver sua mistura química ligeiramente alterada poderia dar origem a compostos como a grafite e carbonatos em vez de silicatos. Esses discos poderiam ter um excesso de carbono, ou uma falta de oxigênio.

Assim, planetas com um conteúdo de carbono relativamente mais alto poderiam ter expulsado os planetas ricos em silicatos. Um indício fascinante que reforça este cenário envolve um dos habitantes mais inócuos do Sistema Solar - os meteoritos condritos carbonados.

Esses meteoritos parecem pedaços de carvão e devem ter se originado em asteróides recheados de carbono que se formaram na nebulosa proto-estelar. Isto significa que o disco solar pode ter variado quimicamente, formando bolsões de carvão.

Os bolsões podem ter formado asteróides carbonados, mas que não continham matéria suficiente para formar planetas completos. Um lugar muito provável de encontrar planetas carbonados quase sólidos seria em órbitas em torno de pulsares ou de anãs brancas massivas. No entanto, até agora os astrônomos só encontraram dois pulsares com planetas.

Um deles, catalogado como PSR B1257+12. foi descoberto por Alex Wolszczan e Dale Frail em 1991 e está a 1.000 anos-luz de distância, na constelação de Virgo (Virgem). Dois dos quatro planetas do sistema têm massa semelhante à da Terra - um tem a massa da Lua e o outro tem massa comparável à de um asteróide.

O segundo sistema de pulsar, PSR B1620-26, encontra-se no aglomerado globular M4 em Scorpius (Escorpião) e tem massa semelhante à de Júpiter.

Um pulsar nada mais é que o núcleo supercomprimido de uma estrela, que explodiu como uma supernova ou se formou pelo colapso de uma anã-branca. A dinâmica do sistema M4 sugere que o planeta gigante gasoso foi capturado. Os planetas terrestres em torno de PSR B1257+12 devem ter se formado após o espetáculo pirotécnico dantesco que deu origem ao pulsar. Mas como isso aconteceu?

Em 1991 e 1992, Philip Podsiadlowski, Mario Livio e seus colaboradores propuseram um cenário pós-apocalíptico para a formação dos planetas em torno de pulsares e anãs brancas massivas. No modelo proposto duas anãs-brancas se fundem para formar um único corpo: uma anã-branca ainda mais massiva ou um objeto tão pesado que colapsa, formando uma estrela de nêutrons.

Enquanto as anãs-brancas estão espiralando uma em torno da outra, forças de maré desintegram uma delas. Isto cria um disco, semelhante ao disco proto-estelar que circunda uma estrela recém-nascida. O disco deveria ser rico em carbono, pois esse elemento é predominante nas anãs-brancas.

Os planetas aglutinados no disco seriam formados praticamente de carbono puro. "As superfícies de planetas carbonados devem ser cobertas por uma camada compostas com cadeias carbônicas longas - algo parecido com alcatrão", acrescenta Kuchner. Estes compostos de carbono devem ter se precipitado na superfície depois de serem sintetizados fotoquimicamente numa atmosfera de monóxido de carbono e metano.

A superfície desses planetas também deve ser muito seca, porque os carbonatos repelem quimicamente a água para criar monóxido de carbono e metano. "Viver nesse planeta seria praticamente o mesmo que viver em Los Angeles, onde o smog e o asfalto predominam", afirma Kuchner.

A crosta seria resistente a altas temperaturas devido à proximidade com a estrela aparentada. Para ter uma idéia de como o carbonato de silício é rígido, visite uma montadora de veículos automotivos. O material é tão resistente ao calor que é utilizado em todas as ferramentas de corte, em brocas e em partes internas de motores de motocicletas.

Os eventos que ocorrem abaixo da crosta deveriam ser muito mais glamurosos. Um dos elementos mais abundantes no Universo, o carbono puro, só existe em algumas poucas formas. Normalmente, é um sólido preto e macio - a grafite, que encontramos nos lápis comuns.

A fuligem presente no escapamento do automóvel forma as "buckyballs" - estrutura formada por 60 átomos de carbono que se unem formando uma malha esférica, como uma bola oca.

Sob altas pressões e temperaturas, os átomos de carbono se distribuem em planos cristalinos para formar uma substância absolutamente transparente e brilhante-a mais dura encontrada na Natureza - o diamante. Grafite compactada poderia formar camadas de diamante de vários quilômetros de espessura dentro de um planeta carbonado.

Uma nova interpretação dessa idéia é apresentada no livro de Arthur Clarke 3002: A odisséia final, de 1996. Nele, uma montanha gigante de diamante ejetada do núcleo de Júpiter é encontrada na lua Europa. Esse episódio baseou-se na especulação científica de que as altas pressões e temperaturas encontradas no interior dos planetas gigantes gasosos podem converter metano em diamante.

Em 1999, pesquisadores da Berkeley University, na Califórnia, produziram poeira de diamante comprimindo metano líquido a uma pressão de centenas de milhares de vezes a pressão atmosférica na superfície da Terra.

É possível imaginar também que um disco circunstelar em torno de uma estrela normal poderia criar um sistema planetário híbrido, contendo os dois tipos de planetas: alguns ricos em silicatos e outros ricos em carbonatos. Isto seria um tema excelente a ser explorado pelos autores de ficção científica.

Imagine um sistema de planetas onde se promove uma competição em que é preciso voar até um planeta vizinho e garimpar seus diamantes. Nessa disputa saem lucrando os habitantes do planeta-diamante que acreditam estar fazendo um bom negócio. Nesse planeta os diamantes são tão abundantes que estão incrustados nas rochas de granito, usadas como brita.

No seu processo evolucionário nossa galáxia vai se tornar cada vez mais rica em carbono, uma vez que no processo de envelhecimento de estrelas do tipo solar os elementos mais pesados são processados e devolvidos ao espaço. Finalmente, em várias dezenas de bilhões de anos, os planetas carbonados serão os tipos mais comuns de planetas terrestres na Galáxia. Mas será que eles terão condições de abrigar vida?

"Cozinhe-os com a luz ultravioleta de uma estrela durante bilhões de anos e poderá surgir qualquer coisa", afirma Kuchner. A disponibilidade de água pode vir a ser um problema, mas sob certas condições ela poderá existir. Ou poderá haver oceanos de hidrocarbonetos.

Nesses mundos, a complexa química da vida poderia ocorrer a quilômetros de profundidade e poderia ser bastante exótica para os nossos padrões. Haveria criaturas comedoras de silicatos e óxidos e o carbono substituiria o oxigênio no seu metabolismo.

Nas futuras buscas por exoplanetas, os planetas carbonados poderiam ser identificados espectroscopicamente utilizando os telescópios espaciais ópticos e de infravermelho. Inicialmente seriam feitas observações de trânsitos, para sondar a atmosfera do planeta e determinar se haveria abundância de monóxido de carbono, em vez de vapor de água.

Se um planeta desse tipo fosse descoberto, os astrônomos mais jovens poderiam batizá-lo de Lucy, aproveitando a canção clássica dos Beatles, de 1967, Lucy in the sky with diamonds, onde a letra original, "Picture yourself in a boat on a river (Imagine-se num barco num rio) With tangerine trees and marmalade skies (Com árvores de tangerina e um céu de geléia de frutas)", seria adaptada para "Picture yourself on a methane river (Imagine-se num rio de metano), With tarry black mountais and carbon monoxide skies (Com montanhas negras de alcatrão e um céu de monóxido de carbono)".

Os primeiros planetas descobertos além do nosso sistema solar figuram hoje entre os sistemas extra-solares mais bem entendidos. Quando Alex Wolszczan e Dale Frail detectaram um trio de planetas girando em torno do pulsar PSR B1257+12, em 1991, passaram um mau pedaço por acreditar nisso.

Afinal, um pulsar se forma a partir do colapso do núcleo de uma estrela massiva que desaparece como supernova. Ninguém achava que aquele fosse um ambiente favorável para a formação de planetas, mas de alguma forma a Natureza encontrou um caminho.

Wolszczan e Frail mediram os sinais de rádio sincronizados como um relógio, emitidos pelo pulsar e encontraram variações mínimas no seu período - os sinais gravitacionais sutis de planetas puxando o pulsar que girava vertiginosamente. Quando os dois astrônomos anunciaram a descoberta, em 1992, tinham flagrado os três planetas em suas órbitas.

O sistema PSR B1257+12.
É formado por quatro planetas que giram em torno do pulsar, - uma versão do Sistema Solar em escala reduzida à metade. As distâncias entre os três planetas terrestres internos guardam entre si a mesma proporção que Mercúrio, Vênus e Terra.

A órbita do quarto planeta descoberto recentemente é cerca de seis vezes maior que a do terceiro, o que, na mesma escala, o colocaria bem no meio do cinturão de asteróides do Sistema Solar.

As observações descartam definitivamente a existência de qualquer outro planeta massivo mais distante nesse sistema. O minúsculo quarto planeta, com massa de apenas um quinto da massa de Plutão, deve ocupar, nesse sistema, o mesmo ponto extremo que Plutão ocupa no Sistema Solar.

"Surpreendentemente, o sistema planetário em torno desse pulsar se parece mais com o nosso Sistema Solar que qualquer outro sistema planetário extra-solar já descoberto em torno de uma estrela semelhante ao Sol", conclui Konacki. - Richard Talcott

Os astrônomos já descobriram vários planetas extra-solares - aproximadamente duas centenas desde que os primeiros foram encontrados em 1991. Muitos deles são dez vezes mais pesados que a Terra, um efeito seletivo do método adotado porque o mais prolífico para encontrar planetas utiliza o efeito gravitacional que exercem sobre as estrelas em torno das quais giram.

Os poucos planetas pequenos encontrados até hoje giram em torno de pulsares, sob condições muito diversas de mundos parecidos com a Terra. A Nasa tem planos para montar vários observatórios no espaço para procurar planetas mais parecidos com a Terra (ver Planetas extra-solares, Astronomy Brasil, outubro de 2006).

O primeiro da lista, o Kepler, vai captar ligeira diminuição no brilho produzida pela passagem de planetas na frente das estrelas, utilizando uma amostra de 100 mil estrelas.

O Kepler será lançado em 2008. Um ano depois, a Space Interferometry Mission (Missão do Interferômetro Espacial) pretende detectar oscilações mínimas induzidas no movimento de 250 estrelas próximas por planetas do tamanho da Terra. A missão mais importante será a Terrestrial Planet Finder - TPF (Buscador de planetas terrestres) com dois observatórios complementares.

O primeiro será um coronógrafo, que bloqueia a luz da estrela-mãe para encontrar planetas pequenos. O segundo será uma série de telescópios infravermelhos que funcionarão como um interferômetro.

Os observatórios TPF vão medir as dimensões, temperaturas e órbitas dos planetas do tamanho da Terra. Os espectroscópios do TPF vão medir as quantidades de gases comodióxido de carbono, metano, ozônio e vapor de água para saber se os planetas poderiam abrigar vida. - R.T.














































































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